Passos

Anjo caído na minha janela

Entra que a chuva não tarda

Anjo, me diga o que é aquilo

Que eu sinto quando olho nos olhos daquela

Menina


A Lua pede pro Sol um descanso

Eu não aguento mais ficar sem dormir

De preto você fica sempre tão linda

E eu fico triste quando penso

Em mim


Nunca mais amei ninguém

A tarde cheirava como você

E no caminho que o rio corria

Lírios caiam de meus olhos


Água gasosa brotando da fronte

Como um suor adocicado, um mel

Me queima mais do que o fogo divino

O Anjo me levou a menina pra longe

Daqui

Flores para Solidão

                Noite. Chuva. Frio. Ninguém ousa sair na rua. A chuva, pesada, dura mais que uma semana. Pra Pedro Pascoal seria o momento perfeito pra morrer. E foi. No banheiro. Uma queda. A cabeça bate na borda da banheira. Um corte. Sangue. O corpo boiando na banheira. Espuma. Sangue. Chuva. Lágrimas. Não, não há lágrimas. Pedro Pascoal não tinha ninguém...

                Dia. Um mendigo qualquer tenta ganhar seu dia. Sol forte. Fome. Ele se sente tonto. Carros. Ele está no meio da rua. Como fora parar lá? Sinal verde. Ele tenta se desviar dos carros. Parece que ninguém o vê. Ninguém o vê. Uma queda. Um pneu sobre sua cabeça. Sangue. Apito. Multidão, que logo se dispersa. Era só um mendigo, só um mendigo. Seu corpo é jogado na vala do esgoto. Ele não tinha ninguém...

                Noite. Maria das Graças recebe seu primeiro salário. Há dois meses chegou à capital, sozinha. Há um, conseguiu o emprego de garçonete. E não é muito longe da casa dela. Basta atravessar aquele beco. Mas o beco é tão escuro! Ela sempre se apressa quando está ali. Mas hoje ela está muito feliz pra se importar com isso. Em dois meses nada aconteceu. Não seria hoje. Escuro. Barulho. Medo. Ela acelera o passo. Corre. Uma queda. Mãos a agarram. Medo. Dor. Tapas. Sexo. Roubo. Grito. Ele saca um canivete. Ela nunca mais vai gritar. Sangue. E Maria das Graças não tinha ninguém.

                Dia ou noite. Tanto faz. Uma pessoa qualquer passeia por um blog qualquer, lendo. Lê sobre morte. Lê sobre solidão. De repente fecha o blog e começa a pensar. Levanta pra ir ao banheiro, ou comer algo. Não importa. Uma queda. A nuca bate violentamente na quina da mesa da sala. Sangue. Silêncio. Escuro. Você tem certeza de que tem alguém?


Peraí, sofá!

                 Final de semana. Tomei todas as cachaças possíveis. Agora chegar em casa e dormir, pois amanhã é dia de trabalhar. Ah, aqui, cheguei!

                Escadas, escadas, odeio todas as escadas. Vou pedir um elevador de presente de natal! E essa porra dessa chave que não entra na fechadura... Pudera, eu nem sei qual dessas fechaduras é a certa. Consegui!

                A sala, ah, a sala! Quase no quarto. Falta pouco. Vou me apoiar na parede e esperar o sofá parar de correr. Uma, duas, três, quatro voltas... É, o sofá tá animado! Vou aproveitar e tomar um leitinho na cozinha.

                Porra, a luz tá queimada! Num tô vendo nada. Cadê a geladeira? Aqui, achei! Pronto, luz... leite, leite, leite... Não tem leite? NÃO TEM LEITE? Que porra, vou ter que dormir sem tomar leite. Que jeito...

                A sala de novo. Oi, sofá, não cansou ainda, não, foi? Vou pular em cima de você... Agora!!! Porra, ele conseguiu escapulir. Que porrada na car eu tomei. Ai!! Fiquei mais tonto ainda. Melhor ir dormir logo. O quarto, o quarto, em que direção fica o quarto, mesmo? Ali, eu acho que é ali. É, é aqui mesmo. Achei! Dormir, finalmente.

                Ah, como é bom tirar a roupa! O sapato, então... Vixe, nossenhora, que vontade de bater um mijão!!! Lá vou eu de novo, enfrentar o poderoso sofá. Agora eu vou passar correndo. Ele nem vai me ver.

                Quero ver agora, seu sofá! Porra, peraí, rasteira é sacanagem. Seu sofá apelão... Deu levantar daqui que você vai ver! Venha, agora!!! Porra, outra rasteira! Melhor sair correndo. Upa, pronto, escapei. Esse sofá corre mais que um puro-sangue, ave Maria!

                Ah, fazer xixi... O barulhinho do mijo batendo na água da latrina... É muito bom... vou aproveitar e escovar os dentes. Eu não ia escovar, não, mas já tô aqui... Posso precisar deles no futuro. Agora tenho uma missão terrível pela frente; encarar novamente aquele sofá. Final de final de semana é foda! Vou correndo pro quarto, tenho que trabalhar amanhã.

                Consegui! Consegui!! Atravessei a sala sem tomar uma rasteira !!! Agora dormir, uau! Ué, cadê mô cobertô co mô cherim? Cadê? Ô num sei dormir sem ele! Ô quero, ô quero... Vô procurar. Cadê, cadê, cadê, cadê? Aqui!!! Achei mô cobertozim. Agora, sim, vô podê mimi. Bas notche!


                TRINGUILINGUILINGUILING


                Ah, não!! Essa porra de relógio não podia esperar nem uns dez minutinhos pra tocar? Tinha que ser logo na hora que eu consegui deitar? Porra!!! Agora é hora de ir trabalhar. Segunda-feira é uma merda! Ainda mais com meu carro quebrado. Vou ligar pra Cofengo pra ver se ele me dá uma carona. O fim-de-semana dele deve ter sido bem melhor que o meu...


P.S.: Tomar rasteira de sofá vestido de paletó e gravata é a pior coisa que pode acontecer a um homem.


Vermelho

O corte que sangra
E escorre sangue que tinge
De vermelho, eu sangro
E sinto dor

Sento e sentado eu vejo
O sangue vermelho marcando
A pele com um caminho
De dor

Peco, eu pego o sangue
Bebo, embebo a pena
Escrevo linhas tortas
No meu coração

Letras de sangue vermelho
Que marcam a vida marcada
De quem nunca teve seu
Próprio perdão

Perco, eu peco, eu bebo
Meu próprio sangue vermelho
Deixo um batom marcando
A minha boca

Deito, eu durmo, não penso
Tenso, meu corpo vermelho
De tanto sangue se
Deita no chão

Fraco, sem sangue, no
Chão vermelho de sangue
Meu sangue quente
Agora me deixa na mão

Frio, meu corpo sem sangue
Morto, meu peito sem sangue
Em cima da poça do meu sangue
Que ficou no chão

Último Pranto

Chorei meu pranto último, talvez,

Por ti, que estás perto e longe de meu peito.

(Choras por mim, também?)


Onde fostes, onde estás, me avisa.

Não me deixes só, contigo,

Não te toco, não te vejo,

Sinto, apenas, e repito:


Chorei meu pranto último, talvez,

Por ti, que estás longe e perto de minha boca.

(Pensas em me beijar, também?)


Vivo, corro, fujo, morro,

Choro e me calo por ti.

Sentes caro o meu carinho mais caro,

Mas finges não ver e não me ouvir.


Grito alto em teu ouvido.

Repito:


Chorei meu pranto último, talvez,

Por ti, que estás longe e perto dos meus olhos.

(Sempre lembras de mim, também?)


Antônimos estouram em minha cabeça,

Chuva, sol, amor e ódio.

Relâmpagos percorrem meu id,

Meu ego morre; eu repito:


Chorei meu pranto último

Por ti, que estás longe e perto de minha alma.

(Levarás flores a mim, também?)

Algo Além de Tudo

Línguas de fogo que varrem o luar

Me lembram centelhas de um olhar

O escuro se esconde de meus medos

O vento me nina com seus dedos


Do sol quero luz, quero calor

Me afogo num lamaçal de dor

Abraço uma boca de ninguém

Depois vou voando muito além


O mundo é mais surreal que meus sonhos

As estrelas me olham me culpando

Os cascos retinam sobre as ondas

Delfins fumegantes se lançando às pontas


Meu olho assustado se esquece de ver

Meu punho cerrado começa a arder

O sangue fervente respinga no chão

Um tronco distante que perde a razão

A Mão Que Pede

Dê uma olhada, veja o céu vermelho

Alguém sangrou meus olhos

Salte e mergulhe no rio sangrento

Beba e sinta febre


Corra e se esconda se você quiser viver

Mas nunca tente gritar

Veja o demônio, ele levará sua mente

E bebrá como se fosse vinho

Fusão

Sinto vontade de navegar

Minhas mãos pelo mar

De seus cabelos

E aportar tranquilo

Nas docas de seus lábios

E tornar-me você

Esponjinha

Tua volúpia me atiça

Me ergue forte e com dor

O teu beijo uma premissa

De longa noite de amor


Tuas ancas, quando andas

Querem alguma atenção

O perfume que emanas

Enche de excitação


Tua boca, quando beija

Leva aos céus e deixa

Loucas marcas roxas


O meu rosto irá sorrir

Quando um dia eu sentir

O abraço de tuas coxas

Sereu

Devorar teu beijo

Matar minha sede na tua saliva

Me afogar em teu suor

Me perder em teus cabelos

Me juntar a teu corpo

Dar-te um pouco de mim

Sorrir e

Chorar por teus carinhos

Ver Deus

Tocá-lo

Me sentir livre

Ser livre

Me sentir meu

Ser meu

Ser teu

Ser eu

A Silly Love Tale - Só mais uma história de amor.

            E doía o peito. Doía tanto que ele não sabia o que fazer. Nem conseguia fazer nada. Não conseguia dormir, nem comer, nem tocar violão, a coisa que ele mais gostava de fazer. Sentia necessidade de fazer alguma coisa, mas não conseguia. Queria esquecer a dor, mas ela voltava. E insistia em ficar. Era uma dor diferente. Começava a doer o peito, depois as vísceras, e então todo o corpo se esfriava. Depois ardia novamente o peito, vísceras, e o corpo se aquecia. E ele passava da euforia à depressão num instante.

            Após alguns dias de desespero ele resolveu ir a um médico. E o médico ouviu seu coração. Batia velozmente, mas tinha um som estranho. Não parecia ter um coração ali. Mas batia, e forte, como um tambor. Depois diminuía o ritmo e ficava difícil de ouvir até com o estetoscópio. E voltava a bater de novo. O médico ficou espantado. Era um caso diferente, ele nunca tinha visto nada igual. Pediu uma ultrassonografia.

            Procurava, procurava, procurava, e onde estava este coração? Bater, batia... Mas não tava lá! O que havia acontecido? Ninguém sabia. Médicos especialistas, pajés, caboclos, ninguém sabia nada. Milagre? Feitiçaria? Como ele pode estar vivo sem um coração? E as batidas? E a dor continuava.

            Era como um punhal trespassando o peito, agora. Era ainda a mesma dor, mas mais forte, mais constante, mais doída. Ele agora perdia o fôlego, desmaiava. Ainda não dormia, nem comia. Foi internado, dormindo com remédios, tomando soro pra se alimentar. E sua família estava cada vez mais preocupada. Os amigos começaram a ir visitá-lo no hospital. Entravam vários ao mesmo tempo em seu quarto. Tentavam animá-lo, faziam piadinhas, ele ria... e em instantes se calava novamente. Olhava pra um ponto e ficava ali, em transe. Até aquele dia.

            No meio de mais uma turma de amigos a visitá-lo estava ela... Ela... os olhos dele saíram do transe e entraram naqueles olhos claros que o olhavam preocupados. Ele olhou a pele do rosto dela, sua boca, lembrou de seus beijos macios... Quis alisar seus cabelos. Ganhou um abraço e um beijo no rosto. Ele sorriu, dessa vez de verdade. Todos falavam ao mesmo tempo, mas só uma voz ele conseguia escutar. Ele segurou a mão dela e ficou assim até se despedirem. Ela prometeu voltar breve. Ele sorriu.

            A fome atacou, então, seu estômago. Ela estava tão linda! Vestido preto, lindo contraste com sua pele alva. E o perfume de seus cabelos? Ele pediu comida, e comeu! A dor não doía mais. Só um calor, saindo do peito e se irradiando por todo o corpo.

            Ele finalmente voltou ao normal. Recebeu alta, estava indo pra casa! Mas sem doença, sem internação. Sem internação, sem visitas, sem ela. A dor voltou. E dessa vez a garganta ficava seca. Não adiantava quanta água ele bebesse, sua boca continuava seca.

            E cada nuvem, cada árvore, cada som, cada pessoa, tudo fazia lembrar dela. Seus olhos claros, sua boca pequena... E o travesseiro era agora como pedra, os dias como décadas. E ele resolveu procurá-la. Precisava melhorar. Não aceitava essa situação. O tédio em sua casa era enorme, mas suas pernas não tinham vontade de ir a lugar algum. Quando ele decidiu ir atrás de sua cura, as pernas se levantaram.

            Estavam hesitantes, é verdade, mas se levantaram. Doía o peito e seu corpo se curvava, mas ele estava de pé. E ele pegou sua agenda de telefones e foi até o nome dela. E ligou. Ela não estava lá... Quer deixar recado? Não, depois eu ligo. Como eu vou encontrá-la? Tem que ser logo. E seu peito doía menos quando ele pensava em procurá-la. Uma onda de alívio percorria seus músculos, ele se sentia mais forte.

            Ele olhou pra porta, e saiu. Pra onde ele queria ir? Nem ele sabia direito. Talvez ao Rio Vermelho... Mas acabou indo ao Iguatemi. Alguma coisa o levava até lá. Ele se dirigiu à praça da alimentação. Pediu uma Coca, encontrou uns amigos. Ele conversou um pouco, se distraiu, riu. Mas era um riso diferente, não era um prazer, era um alívio. O riso liberava aquele aperto, aquela dor que estava presa dentro de seu peito, no lugar de seu coração.

            Então, do outro lado da praça da alimentação, passaram dois olhos claros, rindo alto. Ela? Não pode ser... Mas é!!! Ele olhou novamente para o ponto onde ela estava. Mas ela não estava mais lá. Onde poderia estar? Ele a viu caminhando para o elevador. Ele se despediu dos amigos e correu em direção a ela. Muita gente. Ele não conseguia ir muito rápido. Ele finalmente chegou ao elevador, mas ela já tinha entrado. Segundo, primeiro, térreo, gê um, gê dois, gê três. Uma dor incrivelmente grande assaltou o seu peito, fazendo-o quase cair no chão. Ao se recuperar, ele se levantou e desceu correndo as escadas, rápido, até o gê três. Viu, distante, uma enterprise verde já saindo. Seu peito ardia, queimava. Suas vísceras doíam tão intensamente que ele não conseguia se mover, só ficar ali, deitado no chão. Seu corpo fervia, ele sentia frio. Pouco a pouco o frio foi passando, seu corpo esfriando, até ele começar a suar de calor. Ele se levantou com as pernas bambas e seguiu até a saída da garagem. O sol derramou seus raios sobre ele, e ele continuava com o corpo frio, um frio cadavérico. E um vazio no peito.

            Ele se sentou no meio-fio. Carros passavam a toda velocidade perto de suas pernas. Ele pôs a cabeça entre as mãos e começou a pensar no seu coração. O que poderia ter acontecido? E por que ela me fez sentir assim? Foi no dia que a enterprise me levou ao passado? Ou no dia que fomos à lua? Ele realmente não sabia o dia que seu coração havia sumido. Poderia, também, ter sido no dia em que ela dissera a ele: “Não é por mal, mas hoje eu vou te fazer chorar.” E ele não havia chorado. Fora ali que havia começado a doer seu peito. Mas ele já sentira antes um vazio dentro de si.

            Então ele se levantou e começou a caminhar. Do Iguatemi foi até Itapuã, sentou-se sob o farol. Queria que uma luz indicasse o que ele deveria fazer. Mas não indicava, ele novamente se levantou e começou a caminhar. Pensou em ir pra Vitória. Mas não foi... Perto ali do Rio Vermelho, uma foquinha lhe disse onde ela estava. Ele pensou em levar foquinha consigo, mas ela estava cansada, fumava um cigarro. E ele foi só, atrás de seu coração.

            Montou em uma moto emprestada por foquinha e foi até a casa onde estava seu coração, perto das nuvens. E lá estava a meta de sua aventura, pairando no céu. Como chegar lá? E seu peito doeu quando ele a viu. Ela estava linda! Mas não olhava para ele. Os olhos dela viam o infinito, mas não viam ele ali, tão perto. E seus olhos se avermelhavam, ardiam. Ele não chorava, não conseguia. Uma ânsia subia pela sua garganta, parecia que o vazio crescia em tamanho dentro dele.

            Ele pensou em desistir de tudo, ficar ali, parado, até o juízo final. Mas aconteceu... Ela olhou pra ele. E se espantou. No peito dele surgiu um forte ribombar, como se inúmeros tambores tocassem em ritmo frenético. Tudo parecia estar em slow-motion. De repente ela começou a mover os lábios: três letras. Ela disse as três letras. Ela o reconheceu... E ele começou a flutuar.

            Era como se ele caminhasse nas nuvens. Seu corpo estava leve, a dor já não doía. E ele foi subindo, subindo, até entrar pela janela da casa dela. Ele tentou olhar em direção a ela. Mas seus olhos se ofuscaram. Ajoelhado, ele implorava por seu coração. Seu peito doía, ardia. Ele insistia em olhar pra ela. Ela era tão linda, tão linda... Os olhos dele já estavam sangrando, mas não conseguia desviar o olhar.

            Ela tentava falar com ele, ele não ouvia. Pouco a pouco ele foi entendendo o que ela estava a dizer. Ela dizia ter medo do futuro, do passado, do presente. E entregava a ele um coração. Ele, então, percebeu que seria pior. Seria pior que não ter um coração, seria pior que viver com aquela dor, seria pior vê-la recusando, devolvendo seu coração. E doía agora todo o corpo, ele tinha convulsões. A luz vermelha daquele coração se aproximava de seu rosto. Suas unhas rasgavam sua pele, seus dentes serrados não deixavam ele falar. O peito parecia em chamas, parecia trovejar. Suas vísceras estavam como que derretendo. Ele não queria mais que ela lhe devolvesse o coração.

            Sem mais pensar, ele apanhou uma ponta de flecha que estava por ali, no chão, e arremessou em direção àquele coração pulsante. A seta atingiu o órgão em cheio, derrubando-o da mão dela, fazendo-o rolar pelo chão, sangrando e murchando. No mesmo instante ela gritou, levando a mão ao peito. Seus olhos estavam úmidos, ela chorava. Ele então percebeu o que havia feito. Ele a matara. Era o coração dela que ela havia-lhe oferecido. Ele a matara. Seus olhos ensanguentados não conseguiam chorar, ele apenas gritava. Se aproximou do corpo dela, ainda vivo. Tomou a cabeça dourada no colo, alisou seus cabelos. Beijou suavemente aquela boca macia, o último beijo. Um último suspiro.

            Na mente dele, torturada pela dor, apareceu a imagem de uma minhoca a dizer que o diabo é sempre o amor. E todas as histórias de amor são tristes, e todas as histórias de amor nunca terminam.



            O peito dele não dói mais. Seu coração está de volta, agora duro como pedra, como que cristalizado. Ele sente saudade daquela agonia que ele sentia, daqueles olhos claros que não olhavam pra ele, daqueles beijos que tão pouco ele provou...