Voa, Pombinha

 Voa, Pombinha triste

Sai do laço que magoa

Vai, tenta, persiste

Não desista assim à toa

Tu consegues, vai, insiste

Pensa só que coisa boa

Se a liberdade 'inda existisse

Vai, Pombinha, voa


Nunca coma deste alpiste

'Inda que a fome te roa

Pensa voltar a voar livre

Liberdade nunca enjoa

Muda a tua carinha triste

Ri, canta, a vida é boa

Ponha tuas asas em riste

Vai, Pombinha, voa


Lembra tudo o que já viste

Lembra, mesmo que doa

Lembra a vida que sentiste

Quando estavas 'inda à toa

Guarda tudo o que disse

Minha voz que 'inda ecoa:

"Deixa de ser triste,

Vai, Pombinha, voa"


Sai do laço em que caíste

Puxa, quebra, 'inda que doa

Força, asas em riste

Vai, Pombinha, voa

As Ofensas do Lodo

Os cristais dos olhos se abrem

E caem no universo

Da lente límpida de mim

Desejo mergulhar em seus olhos

Devorar a serenidade de seus olhos

Flutuar na sua força poética

Desenhar anjos-demônios

E bonecos frenéticos

E crianças enfurecidas

Eu desejo criar o amor eterno

No cristal da Terra

Entrar nas entranhas da transparência

Dos desejos escondidos

Cândido

A noite chega com seu rastro escuro

E cobre tudo

Esconde paisagens

Miragens

Amores e

Dores


O sol sopra o escuro e o transforma

Em azul tecnicolor

E mostra as paisagens

As miragens

Os amores e suas

Dores


Não quero ver o dia de novo

Quero esconder-me na minha noite

E vencer a dor

O Cantador e o Vaqueiro

 O sol vai nascendo lá atrás da serra

Vaqueiro acorda já pegando a sela

Abaixa e faz um carinho na cadela

Monta no cavalo e abre a cancela

Vai indo pra manga para aboiar


Já está de tarde, o sol vai embora

Cantador acorda e já pega a viola

Come alguma coisa até que dá a hora

Pega o instrumento e põe na sacola

Procura um lugar e começa a cantar


O vaqueiro vai aboiando o boi

E quando aboia, ele canta

Cantador também leva gado


O sol vai nascendo lá a trás da serra

Cantador já chega e guarda a viola

Vaqueiro afaga a sua cadela

Sela seu cavalo e abre a cancela

Cantador espera o dia findar

Folha ao Mar

Sempre há o dia

Em que a folha cai da árvore

E rodopia suavemente

Até o chão


Ou desce nas águas

Rápidas de um rio


Um barco à deriva

Que ninguém guia

Cuja única tripulação

É uma pequena formiga

Salva de um afogamento


Um barco que sobe e desce

Aquelas pequenas ondulações

Que conduzem ao mar

Ao mar

Ao mar