Por fim

Hão de marejar meus olhos

quando eu vir o que está por vir

o que está por vir

por vir

porvir

por

vir

vi

vim 

e venci

e lancei a sorte

ao atravessar o Rubicão

que brota dos meus olhos

que marejam e porfiam

Algemas

Buscar um sorriso
escondido 
é lícito 

Querer devorar o olhar
e acalentar o dia
com uma ave
cor de rosa
ou branca

que voa
nas mãos 
pequenas

que poderiam 
ser
algemas

Uma Masmorra Eril

O que eu esqueci?

Como saber, se não me lembro mais?

Quantos anjos caíram?

Quantos se reergueram?

Quantas faces, quantas bocas,

quantas asas e cascos fendidos?

Quem é o Senhor dos Exércitos,

o Guardião das Almas?

Quem é o Deus do Amor?

Eu sou o que sou e serei o que serei,

decapitado e enforcado em minhas próprias vísceras, 

atolado e afogado em meu próprio suor.

Quem salvará a donzela da torre?

Quem matará o dragão

e domesticará o unicórnio?

Quem cavalgará a quimera

e decifrará a esfinge?

Não foi a espada que esmigalhou os muros de Jericó. 

À Lua

Ártemis, deusa brilhante,

Rouba as setas de Eros

E envenena meu peito.


Que tua mira perfeita

Não me erre o alvo.

Estira bem o arco

E trespassa-me na alma.


Faz-me gritar ao sentir

A dor do amor

Atravessando meu corpo


Enquanto brilhas distante

No véu negro da noite.

Zodíaco

Áries e Câncer estão em conjunção

Sagitário conduz o todo

Escorpião pica, mas quem mata é o Touro

Libra coordena o todo

Aquário protege Peixes dos perigos

Gêmeos confunde o todo

Capricórnio na quimera, Leão não morde

Eu não tenho nenhum vestígio

Nada

Nu

Estou nu no quintal de casa

Está frio e eu estou nu

Estou nu, gritando com os braços abertos

Chove e eu estou nu


Um vento frio aquece minha alma

E o meu corpo nu transpira

E o suor evapora

E sobe como fumaça


E minha mente está nua

E todos podem ver por ela

Estou envergonhado

E meu corpo nu envolve minha mente nua


E as gotas que choram

Molham meu corpo nu

Que aquece o vento que sopra

E que espera o sol surgir


O dia vai, a noite vem

A chuva não para

Não é a chuva, sou eu

Estou nublado


Cinza, cinza, cinza, cinza

Espero o cinza ir embora de mim

Meu olhar cinza no céu cinza

Cinza, cinza, cinza, cinza

Empatia

Só eu sinto

O passar do tempo

O soar das vozes

O lamento do vento

O calor do sol


Só eu sinto

O passar dos dias

Lembro aqueles dias

Quero voltar no tempo


Quero voar

Sentir no rosto, o vento

Quero pensar em te sentir


Só eu sinto

O temor do mundo

Ouço todo mundo

Grito a todo mundo

Não me deixem só


Só eu sinto

O que seus olhares

Em todos os lugares

Querem dizer

Voa, Pombinha

 Voa, Pombinha triste

Sai do laço que magoa

Vai, tenta, persiste

Não desista assim à toa

Tu consegues, vai, insiste

Pensa só que coisa boa

Se a liberdade 'inda existisse

Vai, Pombinha, voa


Nunca coma deste alpiste

'Inda que a fome te roa

Pensa voltar a voar livre

Liberdade nunca enjoa

Muda a tua carinha triste

Ri, canta, a vida é boa

Ponha tuas asas em riste

Vai, Pombinha, voa


Lembra tudo o que já viste

Lembra, mesmo que doa

Lembra a vida que sentiste

Quando estavas 'inda à toa

Guarda tudo o que disse

Minha voz que 'inda ecoa:

"Deixa de ser triste,

Vai, Pombinha, voa"


Sai do laço em que caíste

Puxa, quebra, 'inda que doa

Força, asas em riste

Vai, Pombinha, voa

As Ofensas do Lodo

Os cristais dos olhos se abrem

E caem no universo

Da lente límpida de mim

Desejo mergulhar em seus olhos

Devorar a serenidade de seus olhos

Flutuar na sua força poética

Desenhar anjos-demônios

E bonecos frenéticos

E crianças enfurecidas

Eu desejo criar o amor eterno

No cristal da Terra

Entrar nas entranhas da transparência

Dos desejos escondidos

Cândido

A noite chega com seu rastro escuro

E cobre tudo

Esconde paisagens

Miragens

Amores e

Dores


O sol sopra o escuro e o transforma

Em azul tecnicolor

E mostra as paisagens

As miragens

Os amores e suas

Dores


Não quero ver o dia de novo

Quero esconder-me na minha noite

E vencer a dor

O Cantador e o Vaqueiro

 O sol vai nascendo lá atrás da serra

Vaqueiro acorda já pegando a sela

Abaixa e faz um carinho na cadela

Monta no cavalo e abre a cancela

Vai indo pra manga para aboiar


Já está de tarde, o sol vai embora

Cantador acorda e já pega a viola

Come alguma coisa até que dá a hora

Pega o instrumento e põe na sacola

Procura um lugar e começa a cantar


O vaqueiro vai aboiando o boi

E quando aboia, ele canta

Cantador também leva gado


O sol vai nascendo lá a trás da serra

Cantador já chega e guarda a viola

Vaqueiro afaga a sua cadela

Sela seu cavalo e abre a cancela

Cantador espera o dia findar

Folha ao Mar

Sempre há o dia

Em que a folha cai da árvore

E rodopia suavemente

Até o chão


Ou desce nas águas

Rápidas de um rio


Um barco à deriva

Que ninguém guia

Cuja única tripulação

É uma pequena formiga

Salva de um afogamento


Um barco que sobe e desce

Aquelas pequenas ondulações

Que conduzem ao mar

Ao mar

Ao mar

Doença

Estou vomitando palavras

No meio da noite

Talvez assim o que de ruim

Saia

De

Mim